sexta-feira, setembro 30, 2005

Marques Mendes, palmo a palmo


Bem sei que em Portugal ninguém é preconceituoso. Não ligamos a deficiências físicas, compreendemos e facilitamos a integração de pessoas com deficiências cognitivas, naturalmente não será a altura de um homem que irá condicionar a nossa apreciação. Certo? Talvez… E se estiver a falar de Marques Mendes?
Admitam que não houve pelo menos um neurónio dessas mentes que teve esta reacção: “então mas este tipo vai falar desse meia-leca?”.
Thimothy Judge e Daniel Cable, professores catedráticos de universidades americanas, analisaram os dados de quatro grandes estudos em que recolheram informação diversa sobre o percurso de milhares de pessoas, desde o seu nascimento até à idade adulta. Surpreendentemente descobriram que 2,5 cm de altura se traduziam em mais de 789 dólares de proveitos anuais! Demonstram que existe um arquétipo ou estereótipo na sociedade que tende a valorizar a altura. Judge formula a teoria de que essa tendência pode advir de tempos remotos da evolução humana, quando na savana a altura era característica indispensável para uma liderança forte.
[Permitam-me o à parte, mas, talvez por Portugal ser pequeno, o meu metro e quase noventa, tem-me valido de pouco!!]
Voltando à refrega… Marques Mendes viverá sempre com isso e naturalmente com a sua personalidade que fez dele um homem, daquilo que se convencionou designar de aparelho. Não o é no sentido geral da expressão, mas é verdade que sempre assumiu cargos governativos e parlamentares, que esteve ao lado de todos os líderes à excepção, conveniente, de Pedro Santana Lopes. Os motivos foram e são evidentes.
No entanto Marques Mendes, na convencionalidade do seu percurso, produziu algumas das comunicações mais estimulantes em congressos do PSD e assume como líder da oposição a liderança no combate à política jardinista, que abunda em Portugal e na qual o seu partido é um dos principais responsáveis.
José Sócrates dá uma no cravo e outra na ferradura – entenda-se: retira as subvenções vitalícias e nomeia amigos para cargos de administração em empresas públicas – o actual líder do PSD enfrenta alguns barões do seu próprio partido e coloca-se na mira desses franco-atiradores, caso conquistem as câmaras a que concorrem. Como qualque político a moralidade que apregoa não percorre todo o percurso do arco-íris... há sempre uma ilha atlântica onde o líder do partido não toca e faz questão de fazer tábua rasa do que diz no continente.
Apesar disso, tem, neste momento, uma legitimidade única para chegar a Felgueiras e bradar contra a personificação do descaramento da nossa Justiça, nas figuras de Fátima Felgueiras e de parte da população estigmatizada na insalubridade da democracia local. Marques Mendes exigiu a presença de José Sócrates em Felgueiras para que também protestasse e esclarecesse as dúvidas que pairam no ar. Sócrates não o fará, mas o discurso da credibilidade e do optimismo do país poderia passar pelo baixar da defesa do politicamente correcto.
A legislação tem de mudar e a forma de actuação da justiça é inaceitável. Marques Mendes percebeu-o e fez da Justiça uma das suas bandeiras. Propôs um de regime sobre a matéria, que é apenas uma forma recorrente em Portugal de os líderes partidários assumirem uma postura responsável e uma forma de lançar um isco a um governo maioritário, na esperança de conseguir um peso político que não tem.
Ninguém o ouviu. Porquê? Porque o país está analisado do Minho ao Algarve e da Estremadura à Beira Alta. Até existem alguns projectos, mas há esta incapacidade de um partido na oposição fazer mais do que falar alto e criticar, criticar.
Depois porque ninguém o ouve por ser baixo, por ter uma dicção peculiar e ser unanimemente considerado um líder a (curto) prazo. Dois anos antes das próximas eleições legislativas poderá ter concorrência feroz, caso a situação piore para o PS. De alguma forma, a estabilização do governo do PS poderia ser uma forma de Mendes conseguir calar uma silenciosa oposição por mais algum tempo.
Marcelo Rebelo de Sousa também foi líder numa conjuntura complicada e conseguiu algumas das mais retumbantes vitórias estratégicas do PSD – referendos da regionalização e IVG e revisão constitucional – mas ninguém o ouvia! Chamavam-lhe a “picareta falante”. No presente é vê-lo no papel de consciência crítica da nação.
Marques Mendes não atinge a dimensão intelectual e as capacidades de comunicação de Marcelo, mas, à sua escala (sem metáfora), ainda havemos de o ouvir com uma atenção que não lhe concedemos actualmente, mas nessa altura estará novamente como presidente da bancada do grupo parlamentar do PSD. O que poderemos dizer então? Palmo a palmo chegou lá e pelo menos tentou...

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